domingo, 13 de dezembro de 2009

Jobim deveria ensinar que não há conexão entre torturador e torturado, diz Vanucchi

Haroldo Ceravolo Sereza
Do UOL Notícias
Em São Paulo

Apesar de realçar que tem uma "convivência absolutamente tranquila" com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, o ministro Paulo Vanucchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, reconheceu que há uma polarização entre as duas pastas.

Polarização com ministro da Defesa é tranquila, diz Vanucchi

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"Nesse sentido, a polarização não é de um xingar o outro. É de argumentar. Dizer: 'Jobim, quando você argumenta que a Lei de Anistia de 1979 foi um acordo entre as partes, diz que nós estamos querendo fazer uma revisão, eu contesto. Não queremos revisão, queremos a interpretação correta, porque há uma interpretação errada e não judicial. A interpretação se formou como senso comum", disse.

Em entrevista ao UOL Notícias, Vanucchi "argumentou" várias vezes como se estivesse conversando com Jobim. "Quando [você, Jobim] diz que 'crimes conexos' quer dizer que o torturador está anistiado... Jobim, você foi presidente do Supremo, você é jurista, entende muito mais do que eu, você deveria me ensinar que conexo, na jurisprudência e na doutrina do direito mundial e brasileiro, é sempre a inter-relação entre ações de um mesmo polo do litígio. Alguém falsifica uma identidade para promover um estelionato. Alguém rouba um carro para assaltar uma padaria. Isso é conexão. Não tem conexão entre assaltante e assaltado, entre assassino e a vítima, o torturador e o torturado."

Para Vanucchi, a Lei de Anistia não foi negociada, e sim resultado da vitória no Parlamento do projeto da ditadura. "Ora, Jobim, acordo entre partes quando um partido tinha um terço da bancada do outro, o outro era o poder, de um poder ditatorial? Não havia democracia, a democracia foi construída para valer a partir dos anos 1980, em doses homeopáticas."

Ele ainda afirmou que a lei de 1979 tinha o propósito de dizer: "'Estão igualmente anistiados os agentes do Estado que tenha praticado crimes no exercício da repressão política'". Mas isso não era possível, continua: "Se dissessem isso, eles derrubavam a tese de que não havia tortura e não havia aparelho de repressão. Então se combinou ali no corredor azul, 'vamos botar essa palavrinha, conexo'...".

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O anúncio da decisão será feito no dia 21 de dezembro. Em entrevista ao UOL Notícias, ministro disse esperar que Supremo decida que Lei de Anistia exclui acusados de tortura.

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Para Vanucchi, sua posição não está em contradição com os interesses dos militares. "Eu me esforço sempre que posso para mandar minha palavra enfática de isso é pelo bem das Forças Armadas. Na democracia, cada brasileiro, cada brasileira, tem de se orgulhar de seus militares", disse. "Não haverá essa comunhão enquanto o país considerar: 'Não mexe com eles'".

Vanucchi disse ainda que tem convicção de que chefes militares não têm mãos sujas de sangue. Ele também elogiou Jobim sobre a relação que mantém com os comandantes das Forças Armadas.

"Realço Jobim. No lançamento do livro 'Direito à Memória e à Verdade', eu fiz um discurso mais conciliador, e ele fez uma palavra de ordem de disciplina, dizendo: 'Não haverá reação, e se houver reação, será comigo'. Quando ele sentou do meu lado, eu disse a ele: 'Você acaba de fundar o Ministério da Defesa'. Sem nenhum demérito de seus antecessores."


* do UOL Notícias